Desvendamos como os diretores estão lidando com pressão dos pais, exigências legais, metas pedagógicas e equilíbrio emocional da equipe.
Liderar uma escola é um desafio que vai muito além do planejamento de aulas e do acompanhamento de notas. Gestores, diretores e coordenadores enfrentam pressões que vêm de todos os lados: pais exigentes, legislações cada vez mais complexas, cobrança por inovação, metas acadêmicas e, ainda, a responsabilidade de manter o bem-estar de professores e estudantes, além do bom relacionamento e da troca com as famílias.
Nesta reportagem especial da Villas Boas Seguros, três gestores educacionais com larga experiência compartilham, com exclusividade, os bastidores dessa função que é, ao mesmo tempo, solitária e fundamental.
Nossos entrevistados:
Ricardo Althoff é diretor do Colégio Dom Bosco, em São José, Santa Catarina. É mentor de gestores educacionais, palestrante e especialista em Gestão Administrativa Financeira Educacional.
Bianca Amador Gomes é diretora do Colégio Vicentino Santa Isabel, em Petrópolis, no estado do Rio de Janeiro. É pedagoga, especialista em Gestão Escolar e integrante da Comissão de Educação da Rede Vicentina.
Fernanda Sampaio Cifali é supervisora pedagógica, orientadora educacional, vice-diretora e atualmente é coordenadora educacional no Colégio Santa Marcelina, na capital fluminense. Tem mais de 14 anos de experiência em cargos de gestão. É formada no Magistério, é pedagoga, pós-graduada em Gestão do Conhecimento, Neurociência Pedagógica, Psicopedagogia e Educação Especial, além de MBA em Gestão de Pessoas.
Gestão escolar: os bastidores que ninguém vê
Enquanto mentor de gestores escolares e palestrante, além de diretor do Colégio Dom Bosco (SC), Ricardo Althoff traz uma visão prática e realista, com a experiência de quem conhece o assunto na teoria e, principalmente, na prática.
"Nos bastidores, a gestão escolar é muito mais complexa do que a visão romantizada que muitos têm. Liderar uma escola em 2025 significa lidar com múltiplas frentes ao mesmo tempo: desde a pressão por resultados acadêmicos, passando pela necessidade de inovar constantemente, até o desafio de manter a saúde financeira e a retenção de alunos. É um jogo de xadrez onde cada movimento exige estratégia. Um gestor que entende isso se prepara melhor para decisões assertivas, sem ficar apagando os incêndios diariamente", enfatiza.
Gestão eficiente
Bianca Amador Gomes, diretora do Colégio Vicentino Santa Isabel, reforça o papel das competências múltiplas entre as habilidades imprescindíveis ao gestor escolar. "Um gestor precisa reunir um conjunto de habilidades que vão além da parte administrativa. Combinando competências técnicas, estratégicas e socioemocionais. A visão estratégica, a liderança e a comunicação assertiva são imprescindíveis para que o gestor desenvolva a sua equipe para alcançar bons resultados. A escuta atenta e a análise baseada em dados fazem toda a diferença para o crescimento da escola", sinaliza a educadora.
Para a coordenadora educacional no Colégio Santa Marcelina, Fernanda Sampaio Cifali, entre as habilidades necessárias ao gestor, são essenciais a resiliência, a flexibilidade, a comunicação eficaz, a disposição para resolução de conflitos, a empatia, o domínio dos processos pedagógicos e a segurança em suas ações.
"É preciso entender que o fim da escola é a formação de um ser humano, preparando-o para a sociedade em seus aspectos acadêmicos e socioemocionais. Quando o trabalho é desenvolvido com seriedade e comprometimento o estudante sente segurança e entrega bons resultados", assegura.
Ricardo Althoff diz que três pilares sustentam um gestor eficiente: visão estratégica, inteligência emocional e capacidade de execução. "Visão estratégica para antecipar cenários e se posicionar; inteligência emocional para gerir pessoas e conflitos; e execução para transformar planos em resultados concretos. Além disso, adaptabilidade e leitura de dados são indispensáveis, decidir sem métricas é caminhar no escuro", alerta.
A busca do equilíbrio: pressão das famílias, exigências legais e metas pedagógicas
Fernanda Cifali associa equilíbrio a seguir regras e envolver a equipe: "O equilíbrio se encontra em cumprir com as regras e fazer o que é correto para a educação dos estudantes. Os responsáveis sentem segurança na escola que cumpre com os combinados e faz prevalecer o que está no Regimento Escolar. As pessoas querem que os filhos se sintam seguros no espaço escolar e essa segurança vem da confiança de que as regras serão cumpridas e de que as famílias serão ouvidas. Essa postura está diretamente relacionada com as leis e as exigências acadêmicas. Quando se faz o que é correto, não existe dúvida sobre o trabalho que deve ser desenvolvido. O gestor tem a função de envolver toda a equipe no cumprimento do planejamento e das regras, protegendo desta forma o trabalho do profissional de educação, trazendo segurança ao processo."
Ricardo Althoff, diretor do Dom Bosco, defende a clareza de processos e a comunicação como resposta ao excesso de cobranças. "O equilíbrio vem de clareza e comunicação. Temos processos bem definidos e uma liderança alinhada para que cada área saiba sua prioridade. Com pais, trabalhamos com transparência, apresentando dados e resultados; nas exigências legais, temos protocolos de conformidade; e nas metas pedagógicas, usamos acompanhamento contínuo. O segredo é evitar que uma demanda 'engula' as outras, cada frente tem seu espaço e seus indicadores", ressalta o mentor.
Bianca vê a busca do equilíbrio como um dos maiores desafios. "É importante trabalhar de forma integrada e em equipe. Os processos precisam estar muito bem alinhados com toda a equipe gestora para que o planejamento e a coerência nas ações fiquem evidentes para as famílias. Todos os processos da escola precisam estar documentados, principalmente tratando-se das exigências legais. A comunicação ativa com as famílias e a postura profissional diante dos conflitos trazem segurança e confiança para a comunidade escolar", garante a gestora.
O esgotamento emocional dos líderes escolares
Ricardo, que acompanha gestores em mentorias, observa que a sobrecarga emocional é uma realidade que precisa ser enfrentada. "Primeiro, é preciso reconhecer que o esgotamento existe e é comum, visualizo isso em minhas mentorias, principalmente com os diretores de escolas. Liderar uma escola exige energia mental e emocional. Aqui, defendemos a criação de redes de apoio, seja com outros gestores, e a organização da agenda para evitar sobrecarga constante. Autocuidado não é luxo, é estratégia para manter a performance", acrescenta.
Bianca também alerta para os sinais de desgaste: "O líder precisa ser acolhido e ter as suas demandas emocionais organizadas. Lidar com a gestão da escola e controlar o emocional é extremamente desafiador. Faz-se necessário estar atento aos sinais de esgotamento. O gestor precisa organizar e confiar na equipe para que as tarefas estejam bem claras e divididas."
Fernanda relaciona esgotamento ao clima organizacional. "O esgotamento emocional pode ocorrer em qualquer ambiente de trabalho em que o clima se encontre adoecido. Na escola não é diferente. O gestor escolar, para não adoecer, precisa entender que quando se trabalha diretamente com seres humanos conflitos existirão. Os problemas precisam ser resolvidos de forma clara, direta e compartilhada. O gestor não tem todas as respostas e precisa de apoio contínuo da equipe pedagógica para que suas ações sejam respaldadas e assertivas", observa.
A gestão gera solidão?
Para o diretor do Dom Bosco, o cargo gera, sim, solidão. "Muitas decisões e responsabilidades não podem ser compartilhadas com todos. Por isso, criar conexões com outros líderes e buscar mentorias é fundamental. A solidão na gestão diminui quando existe um ambiente seguro para compartilhar desafios, trocar experiências e buscar soluções conjuntas", avalia Ricardo Althoff.
Bianca Amador diz que o gestor ocupa um lugar de tomada de decisão, mediação de conflitos e guarda de informações sensíveis. "Isso gera uma solidão natural. Nem tudo pode ser compartilhado com a equipe, e nem todo mundo compreende o peso das decisões. A maturidade profissional traz uma tranquilidade maior para gerenciar estas questões. Mas não é fácil, é uma questão de tempo", opina a diretora do Colégio Vicentino Santa Isabel.
Fernanda Cifali acredita que a gestão não é um cargo que gere solidão, desde que ela seja agregadora. "A gestão participativa é fundamental porque todos os educadores participam do processo educativo. O professor é o que lida diretamente com o estudante e ele é um dos principais protagonistas nesse desenvolvimento. O gestor que atua sem essa gestão que agrega, realmente, pode sentir solidão", defende a supervisora pedagógica do Santa Marcelina.
Resultados, inovação e acolhimento: o tripé da gestão
Ricardo Althoff rejeita fórmulas mágicas e aposta em método: "Trabalhamos com planejamento estratégico anual, onde cada objetivo é desdobrado em ações, prazos e responsáveis. Resultado acadêmico exige acompanhamento pedagógico constante; inovação precisa de investimento direcionado e testes controlados; acolhimento vem de cultura organizacional e treinamento da equipe. É o equilíbrio entre planejamento e disciplina de execução."
Para Fernanda Cifali, os resultados acadêmicos, a inovação e o acolhimento caminham juntos. A educadora sustenta que na escola que valoriza o desenvolvimento integral do estudante, não há como caminhar sem esses três pilares.
"Os resultados acadêmicos ocorrem quando o trabalho é desenvolvido com seriedade, dedicação e comprometimento da equipe pedagógica e do estudante. A inovação é um dos princípios da escola e está ao lado do conhecimento acadêmico porque por meio de projetos pedagógicos e trabalhos avaliativos os estudantes pesquisam, desenvolvem e criam novas soluções para as questões levantadas. O acolhimento é a essência de todo ambiente educativo. Para aprender, o estudante precisa se sentir bem e estimulado. Os estudos mostram a importância do afeto e da segurança para a aprendizagem e para a memória. A escola é o lugar de se construir memórias afetivas que são carregadas para o resto da vida", ressalta a educadora.
Bianca Amador evidencia que cada instituição encontra sua própria forma de equilibrar pressões. "Não existe uma fórmula, cada modelo de gestão atende de uma forma diferente às demandas do mercado. Na nossa instituição temos uma grande preocupação com as questões relacionadas ao acolhimento de nossos estudantes. Os valores da Rede Vicentina e o nosso carisma fazem a diferença para que possamos inovar, alcançando excelentes resultados acadêmicos e ao mesmo tempo, não tornar este momento pesado demais para o estudante. Esta fase da vida precisa ser vivida com qualidade, prezando pela leveza e alegria de estar no ambiente escolar", reflete a especialista.
Formação contínua: um caminho sem volta
O mentor Ricardo Althoff assegura que é possível investir em formação contínua com os profissionais que trabalham na escola, mas isso requer estratégia. "A chave é criar formações conectadas à realidade da escola, mostrando ganhos práticos para o professor. A resistência existe, especialmente entre profissionais mais antigos, mas ela diminui quando o treinamento é respeitoso, participativo e resolve problemas concretos da rotina. Formação sem aplicação prática é só teoria, e isso desmotiva", afirma.
Para Bianca Amador, a formação continuada é imprescindível para que o professor reflita sobre a sua prática e busque melhorar e qualificar o seu trabalho. "Em nossa instituição, conseguimos oportunizar formação para os professores quinzenalmente. Esta foi uma caminhada em Rede, iniciada há alguns anos. Hoje já conseguimos consolidar esta prática e oportunizamos estes momentos de estudo, aperfeiçoando e ampliando o repertório para as aulas. O professor já inclui este tempo na sua carga horária na instituição", conta a diretora escolar.
Fernanda Cifali concorda que a formação contínua reflete na melhora da qualidade do ensino. "Essa formação já faz parte das leis de educação, desde 1988, e os professores, em sua grande maioria, já internalizaram essa necessidade", declara.
Visão de futuro
Ricardo reforça que a liderança escolar em 2025 exige que o gestor tenha a mesma mentalidade de um empreendedor: atento às mudanças, rápido na tomada de decisão e com foco no longo prazo. "As escolas que prosperam são as que alinham gestão pedagógica e gestão administrativa de forma integrada, entendendo que sem sustentabilidade financeira, não há projeto pedagógico que se mantenha", conclui.
Fernanda encerra lembrando a recompensa maior do trabalho: "A gestão escolar é um grande desafio, mas altamente gratificante. Chegar ao término do Ensino Médio e entregar seres brilhantes para a sociedade, não tem preço!"